segunda-feira, 1 de março de 2010

O que os municípios brasileiros têm a ver com as Olimpíadas de 2016?

Já comentei nesse espaço do papel protagonista que os municípios assumem nessa ordem global contemporânea. Sobretudo em um país prestes a realizar uma Olimpíada, principal evento da sociedade global.
O Brasil tem ainda seis anos até a realização das Olimpíadas do Rio em 2016. Em termos de política de esporte de um país sede, a exemplo de Barcelona/Espanha em 1992, Sidney/Austrália em 2000 e Atenas/Grécia em 2004, o objetivo principal se tratou de conquista de medalhas e transmissão ao mundo de responsabilidade e competência para a realização do evento. Outros objetivos vieram na seqüência, como a aquisição de infra-estruturas permanentes, a revitalização de áreas degradadas e a potencialização do crescimento do país para o médio e longo prazo.
No Brasil, vai muito além. Mais que medalhas ou a realização responsável do evento e consolidação de infra-estrutura, a organização política do Brasil para as Olimpíadas deverá abarcar um leque de outras responsabilidades. A busca de conquista de cidadania por meio do esporte; atenção social; educação; bem como ações que impactam no desvio da transgressão juvenil pelas drogas são exemplos inevitáveis que deverão pautar as iniciativas para a realização do programa Brasil olímpico. Na realidade, as ações devem estar articuladas e com foco na prática esportiva séria, co-realizadas maciçamente em todo território nacional.
É importante pensar, planejar e agir nesse sentido. Os desafios para a realização do evento olímpico não são poucos, sobretudo se pensarmos no legado pós-olímpico que se pretende deixar. Com igual complexidade, bate à porta a urgente organização de programas que, de forma integrada, orientem as regiões brasileiras, e seus respectivos governos, a participarem dos projetos.
No dia seguinte à declaração oficial do Rio 2016, o presidente do Esporte Clube Pinheiros de São Paulo (ECP-SP), Antônio Moreno Neto, declarou a necessidade de realização de parcerias com clubes e estruturas de outros estados, mas, sobretudo do interior paulista, para a geração de atletas de desempenho olímpico, visando 2016.
O ECP-SP é forte parceiro do Ministério do Esporte, desenvolvendo, de forma cooperada, os projetos: “Formação Desportiva para Atletas Não-profissionais” e “Preparação de atletas para os Jogos Pan-americanos de 2011 e Jogos Olímpicos de 2012”. Ainda com o objetivo de crescimento do esporte brasileiro, o Pinheiros fundou com outras agremiações o Conselho dos Clubes Formadores de Atletas Olímpicos (CONFAO), que busca ampliar o apoio do governo às organizações que realmente preparam os atletas para defender o país nas principais competições.
Estima-se que, com foco em 2016, se multipliquem os incentivos e parcerias com os clubes e estruturas que já dão certo. Vale ressaltar que estruturas e projetos como a do ECP-SP, estão presentes em quase todas as capitais brasileiras.
Em síntese, um grande processo está para se desenvolver no Brasil com vistas a 2016, como ocorreu em todos os países que já realizaram o evento. Os clubes e estruturas esportivas que treinam atletas têm grande responsabilidade nisso tudo. Mas, protagonista mesmo são os Municípios e poder público, que caso haja interesse, deverão se lançar em busca do desenvolvimento a partir do esporte. E nesse contexto, têm vantagens aquelas cidades que criaram, ao longo dos anos, identidades atreladas ao esporte, ou simplesmente a uma modalidade esportiva, como é o caso de Franca para o basquete, Araraquara com o vôlei e Mococa para com a natação, ambas experiências no estado e São Paulo.
Mas como se desenharia a justificativa de um projeto municipal com foco na geração de atletas de nível e índice olímpico? O primeiro passo a se pensar são com respeito às estruturas esportivas a serem aperfeiçoadas e montadas. E não somente para 2016. Deverão ser sustentáveis e permanentes, ultrapassando o “universo Rio 2016”. É preciso ter em mente que o objetivo do projeto municipal de esporte de alto rendimento seja de enviar atletas de bom desempenho à estruturas maiores do Brasil – para que essas estruturas lapidem os atletas –, pois será cedo para a pretensão de se criar atletas de nível olímpico, em quantidades, já nos primeiros dois anos, tempo de Londres 2012.
Outro ponto importante na avaliação está na relação atleta versus idade em 2016. O foco do projeto tem de ter atenção que grande parte dos atletas olímpicos de 2016, hoje são crianças ou adolescentes, isto é, atletas infanto-juvenis. Nesse sentido, mais que um projeto de atleta, é preciso apresentar ao esportista, e à sua família, um plano de desenvolvimento para a geração do atleta, que inclui bolsa de estudo, bolsa financeira, alojamento, equipamentos de alto rendimento e acompanhamento profissional (educador e preparador físico, psicólogo, médico, fisioterapeuta, nutricionista, etc.).
O financiamento da iniciativa se dará a partir das parcerias envolvidas. O projeto tem que ser concebido pela governança local, envolvendo não somente a Prefeitura Municipal, como também o clube ou estrutura de esporte local, a sociedade civil organizada, empresários, associações, etc. O Ministério dos Esportes do Governo Federal, a Secretaria de Esportes dos governos estaduais, bem como o Comitê Olímpico Brasileiro (COB), as Confederações Brasileiras de modalidades esportivas e outros clubes com mais experiência, como é o caso do ECP-SP, montariam o arranjo institucional. Juntamente, estariam as marcas patrocinadoras, como por exemplo, os Correios, Caixa Econômica Federal, VoeGol, etc., que no caso dos desportos aquáticos (que inclui a natação) são parceiros já de longa data.
Já que estamos falando de natação, trago o exemplo de Mococa, cidade de 70 mil habitantes do estado de São Paulo. Na cidade, anualmente, se desenvolve o troféu “Chico Piscina”, que em 2009 realizou sua quadragésima edição, sendo que desde 1995 é um campeonato internacional infanto-juvenil de natação. Mococa tem grande vantagem consolidada por ser uma cidade pólo da natação brasileira, geradora histórica de nadadores e, até hoje, com forte equipe de atletas.
Em se tratando da natação, todas as entidades, citadas anteriormente, que participam da organização e financiamento da modalidade irão implementar estratégias para a geração de uma cultura de esportes no Brasil. Isso é um fato.
Mococa poderá participar desse macro projeto e levar para o município parte dos benefícios a serem ampliados pela ocasião das Olimpíadas em 2016. No entanto, é necessário que a cidade se aponte como protagonista do processo, pois justificativas não faltarão para a captação de recursos externos. E certamente, as marcas que já apóiam o evento municipal anualmente, não perderão oportunidade de vincular a empresa nesse projeto municipal, mesmo por que essas empresas farão parte de conselho de implantação do projeto. Outros benefícios virão, como, por exemplo, a abertura de linhas de financiamento específicas para projetos que se adequarem nessa temática, e possibilidade de captação, pela Associação Esportiva Mocoquense, por exemplo, de recursos para a ampliação de suas estruturas; bem como a aglutinação de outros projetos institucionais nessa proposta, como a vinculação do SESI, que está prestes a inaugurar uma escola de estrutra grande no município de Mococa.
Realmente, é difícil estimar os benefícios municipais futuros agregados à proposta de “cidade esportiva” parte do esforço brasileiro para a geração de atletas a representarem o Brasil em 2016. Mas, certamente serão grandes, do ponto de vista de ampliação da imagem da cidade para o cenário nacional. O importante, para qualquer município que se lance nessa perspectiva de desenvolvimento através do esporte, é saber e conseguir articular as entidades e pessoas certas na cidade e propor projetos sustentáveis.
A ocasião de realização das Olimpíadas no Brasil em 2016 traz tantos desafios como benefícios. Será uma grande oportunidade para as cidades vincularem o seu desenvolvimento à ajuda externa. O certo é que os municípios que derem as cartas primeiro terão maiores chances de arredondar o projeto. Municípios com vantagens comparativas como Mococa saem na frente, por contar com argumentos que justificam a proposta. Mas isso não é tudo.
Enquanto isso, em reunião sobre o balanço dos Jogos de Vancouver, nos resta a afirmação do belga Jacques Rogge, presidente do Comitê Olímpico Internacional (COI), ao apontar que o Canadá deve servir de exemplo para a organização de futuras competições. "O que outros organizadores podem aprender e foi confirmado aqui: testem, testem, testem tudo antes de qualquer coisa. Eles fizeram um bom trabalho nisso", disse Rogge. O que mais chamou a atenção do dirigente foi a ligação entre a população canadense e a Olimpíada.
Antes de se testar alguma coisa, será necessário concebermos a idéia e toda a responsabilidade trazida pela realização dos jogos. E ter em mente que apenas os esforços movidos no estado do Rio de Janeiro não serão suficientes para a idealização de um bom 2016 de modo permanente.